Marcha das Margaridas de 2023: a reconstrução do Brasil acontece pelas mãos das mulheres

Por Estefane Maria
(Diretora de Mulheres da UNE e Militante da Marcha Mundial das Mulheres)

A Marcha das Margaridas é uma ação feminista que aconteceu pela primeira vez em 2000, na virada do milênio e surge como um espaço de reivindicação e luta, carregando o nome de Margarida Alves, mulher trabalhadora rural e sindicalista, brutalmente assassinada com a intenção de silenciar a voz e cessar a luta, mas, assim como Marielle, outras Margaridas surgiram e são fortalecidas a cada quatro anos, nas ruas de Brasília e todos os dias, em seus respectivos territórios.
A edição de 2023 surge com o mote “Pela Reconstrução do Brasil e Pelo Bem Viver”, retomando a noção de que conquistamos, após muitas lutas nas ruas pela retirada de um governo antidemocrático e violento que ameaçava, principalmente, as nossas vidas enquanto mulheres, com a certeza, também, que fomos nós, mulheres, que estivemos desde o primeiro momento, denunciando o quanto esse projeto político representava nossa morte e regressão de conquistas.
Hoje, o nosso grito e nossa marcha não exigem apenas o fim das violências que ainda nos atingem diariamente, mas a possibilidade de acessarmos uma vida digna e livre, por isso a expressão “bem-viver”. Entendemos que nossa luta ainda é por sobrevivência, mas também perpassa a necessidade diária de cobrarmos respeito às posições que ocupamos, segurança, divisão do trabalho do cuidado com os homens e com o estado, liberdade intelectual e dos nossos corpos e a implementação de políticas públicas que quebrem algumas das ferramentas opressoras e liberem nosso acesso a todos os espaços.
O contexto dessa marcha, diferente de 2019, conta com a possibilidade de diálogo com o governante, que anunciou, no encerramento, a protocolação de algumas das nossas conquistas em oito decretos. São eles: Instituição do Programa Quintais Produtivos para promover a segurança alimentar das mulheres rurais; Retomada da Reforma Agrária com atenção a famílias chefiadas por mulheres; Instituição de uma Comissão de Enfrentamento à Violência no Campo; Criação de Grupo de Trabalho Interministerial para construir o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural — que oferecerá serviços públicos para a população jovem da agricultura familiar e ampliação das oportunidades de trabalho e renda para esse público; Programa Nacional de Cidadania e Bem Viver para as Mulheres Rurais com a retomada do Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural; Criação do Pacto Nacional de Prevenção dos Feminicídios; Retomada da Política Nacional para os Trabalhadores Empregados, para fortalecer os direitos sociais desses operários; Retomada programa Bolsa Verde, que permite pagamento a famílias de baixa renda inseridas em áreas protegidas ambientalmente.
Embora a marcha das margaridas seja um espaço majoritariamente construído por mulheres trabalhadoras rurais, com o objetivo de avançar em pautas concretas, não deixa de ser, em momento algum, um espaço e oportunidade para discussão em torno da vidas das mulheres estudantes, visto que a educação está, necessariamente, relacionada com todas as pautas. A presença da juventude e mulheres estudantes é expressiva na batucada feminista, da Marcha Mundial das Mulheres, que reúne mulheres de todo o Brasil em uma só ala, entoando palavras de ordem, acompanhadas do som do batuque, que potencializa cada uma de nossas vozes.
É importante o reconhecimento frente a um governo que se propõe a dialogar com as mulheres, especialmente após o que vivemos nos últimos seis anos, mas é central que enxerguemos os avanços e conquistas aqui citadas como resultado de muita luta e auto-organização das mulheres, em cada território e no fortalecimento de pautas específicas. Dessa forma, é imprescindível que os nossos debates não se findem aqui. A discussão e o combate às violências contra as mulheres ainda é urgente e perpassa a vida de todas nós, assim como é necessária a capilarização do debate em torno dos avanços das eólicas, por exemplo e o quanto é violento e marginalizador para centenas de mulheres em todo o país.
Avançamos em políticas públicas, em legislações, em ocupação de espaços políticos, midiáticos e sindicais, que atuam como possibilidade de projeção e ampliação dos debates em torno das nossas necessidades e exigências, em busca de um mundo em que todas nós, sem exceção, sejamos livres. A nossa marcha é contínua!

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SEGUIREMOS EM MARCHA ATÉ QUE TODAS SEJAMOS LIVRES!